A II Conferência dos Procuradores do Estado de Rondônia teve sua solenidade de abertura na noite da quinta-feira, 21, no Teatro Guaporé, e contou com a palestra magna da juíza federal, Isabela Ferrari, cujo tema tratou sobre “Inteligência Artificial e Direito”. Na oportunidade, houve também o lançamento da revista Guaporé – publicação com periodicidade anual que teve, em sua primeira edição, artigos científicos, trabalhos técnicos e entrevistas sob a temática de uma nova visão da Administração Pública (tema do evento).
Durante a abertura, o procurador geral do Estado de Rondônia, Juraci Jorge da Silva, ressaltou a importância da Conferência como maneira de fomentar o conhecimento e agradeceu a presença de todos. Participaram da mesa, ao lado do procurador do Estado, a juíza auxiliar da presidência do Tribunal de Justiça (TJ), Silvana Maria Freitas, representando o presidente do TJ, desembargador Walter Waltenberg Silva Junior; o procurador do Estado, Tiago Cordeiro Nogueira, como presidente em exercício da Associação dos Procuradores do Estado de Rondônia (Aper); o subdefensor público geral do Estado de Rondônia, Diego De Azevedo, representando a Defensoria Pública do Estado de Rondônia; Maria Rejane Sampaio, presidente do Instituto de Previdência dos Servidores Públicos do Estado de Rondônia; o presidente da Ordem dos Advogados do Estado de Rondônia, Elton José Assis; a procuradora do Estado e organizadora do evento, Taís Cunha; e a juíza Federal e palestrante, Isabela Ferrari.
Após a abertura, a noite continuou com a palestra magna e finalizou com um coquetel.
Dando continuidade à II Conferência, na sexta-feira, 22, a programação começou com um painel que tratou do “Direito e Tecnologia”. A palestrante, Drª. Ana Cristina Aguilar Viana, falou sobre “Administração Pública Digital” e a Drª. Miriam Wimmer sobre “Transformação Digital e Inteligência Artificial”. Em seguida, foi debatido o tema “Democracia e Informação” com as palestras “Desprezo à Constituição e aos princípios da Administração em tempos de erosão democrática e populismo”, ministrada pela Drª. Eneida Desiree Salgado, e “Acesso à informação e a cultura do sigilo na Administração Pública”, apresentada pela Drª. Karina Furtado Rodrigues.
No turno da tarde, uma mesa redonda deu início aos trabalhos com a participação da procuradora do estado, Marta Lobo, presidindo a mesa, ao lado da defensora do Estado, Denise Luci Castanheira, da procuradora do Estado, Tais Cunha, e da juíza do TJ Úrsula Gonçalves Theodoro de Faria Souza, para debater a “Mediação no novo Direito Processual Civil”.
Encerrando o evento, o painel “Direito Administrativo Contemporâneo” contou com a palestra “Regime Jurídico das Estatais”, proferida pela Drª. Irene Patrícia Nohara, e a mestre Raquel Melo Urbano de Carvalho tratou o tema “Entre a LINDB, a crise do controle e a desestatização: o Direito Administrativo sobreviverá?”.
Na plateia, os ouvintes elogiavam o nível das palestras, das reflexões levantadas e nos intervalos aproveitavam para conversar com as palestrantes e discutir sobre os temas tratados. “Eu gostei do evento principalmente pelas exposições a respeito da Administração Pública e das novas tecnologias empregadas. Para mim foi surpreendente porque eu não sabia que dentro da Administração Pública tinha tantas portas para a autonegociação e resolução de litígios fora do judiciário. Isso foi uma novidade que a Conferência conseguiu trazer para mim. E a expectativa que eu tinha era justamente a oposta porque eu achei que fosse continuar as mesmas tratativas do poder público e o que eu vi aqui foi justamente uma proposta disruptiva, uma proposta inovadora. Foi bastante interessante”, comentou o acadêmico de Direito – Edgar Pessoa Neto.
Acompanhe o que algumas palestrantes falaram:
Palestrante: Isabela Ferrari
Tema: “Inteligência Artificial e Direito”
“A palestra explica porque esse momento em que a gente vive agora é diferente de tudo que já existia em termos de tecnologia. Eu abordo aqueles que eu considero os três principais fatores para explicar o porquê o mundo está evoluindo cada vez mais rápido.
O primeiro fator é o aumento da capacidade computacional em termos exponenciais – então a gente vai ver que a capacidade dos computadores vem crescendo exponencialmente e o acesso a computadores superpotentes vem ficando acessível a cada vez mais pessoas.
O segundo fator é a inteligência artificial que existe desde a década de 70 como técnica, mas que vem apresentando cada vez mais resultados interessantes por causa do nosso terceiro fator que é o big data.
Big data é a grande quantidade de informação que a gente tem disponível. É essa informação que vai servir de base para que os computadores aprendam, e que vai servir de base para a inteligência artificial. E com computadores superpotentes, a gente junta esses três fatores e começa a ver grande mudanças em vários campos como na medicina, na segurança pública, e, como não poderia deixar de ser, a gente vê no Direito também.
A segunda parte da palestra eu falo sobre as ferramentas On-line Dispute Resolution (ODR), como que a iniciativa privada, há algum tempo, vem, de forma bem sucedida, usando ferramentas on-line para possibilitar que pessoas negociem conflitos. E, no terceiro momento da palestra, eu explico como o poder judiciário, olhando para essas experiências bem sucedidas no campo privado, vem incorporando vários desses insights na sua estrutura dando origem ao fenômeno que conhecemos como cortes on-line. Este não é um fenômeno que está distante da gente. Ele está presente no mundo inteiro e realmente é um movimento mundial, a gente encontra diversas iniciativas nos Estados Unidos, em países europeus, asiáticos e também no Brasil.
Ao final da palestra, eu abordo a nossa situação e perspectivas de futuro, destacando como eu entendo que em breve a gente vai ter uma mudança muito grande de cenário. Principalmente observando as inciativas que acontecem na base do judiciário, então os juízes de primeiro grau que trazem muitas inovações em suas áreas, mas, principalmente, as iniciativas capitaneadas de cima, pelo ministro Dias Toffoli – que é um entusiasta das cortes on-line e do emprego de ferramentas ODR para lidar com a grande massa de processos que a gente tem no judiciário; depois dele nós teremos na presidência o ministro Fux, que também é um entusiasta e pensa a tecnologia como uma forma da gente gerenciar a grande massa de litígios que a gente tem no Brasil; e após o Fux vem o Barroso que também se interessa por esse caminho. Então eu acredito que em breve teremos grandes mudanças acontecendo no Brasil. Algumas já estão acontecendo e outras devem acontecer muito em breve.
A minha ideia é essa: é pensar um pouco qual vai ser a justiça desse futuro que está muito próximo da gente e como que nós, operadores do direito em vários campos – o juiz, o advogado, as partes, o procurador, o defensor – como nós iremos nos reposicionar nesse mundo em mutação”.
Palestrante: Ana Cristina Aguilar Viana
Tema: “Administração Pública Digital”
“A minha palestra foi sobre Administração Pública Digital, mas antes de falar da Administração Pública eu foquei em outros aspectos que eu considero relevantes para debatermos os dias de hoje que são a quarta revolução industrial – ou transformação digital – e todos esses impactos que acabam acontecendo na sociedade e a gente, como ser humano, não nota muito e se adapta de forma cotidiana e natural a isso.
Basta a gente pensar na mudança da comunicação em que a gente saiu de um telefone para o WhatsApp e em menos de 10 anos mudou totalmente a nossa forma de comunicação e nem nos demos conta. Quando a gente se percebe, já está adaptado a essa nova tecnologia. Mas quando a gente fala do Direito, ele tem uma certa dificuldade em se adaptar a essa nova tecnologia porque ela já tem normas estabelecidas, estruturas colocadas e nós temos uma tecnologia em uma velocidade muito rápida que traz perguntas novas que até então o Direito não sabia responder.
Podemos pensar no exemplo de ‘não pegue carona com estranhos’, que é uma frase que teria muito sentido até pouco tempo, mas que hoje em dia não tem muito sentido porque pegamos carona com estranhos que é o Uber – que não tem autorização estatal.
Isso mostra para gente que as normas foram criadas para um mundo que era estático e não para o mundo do universo digital. E traz um impacto muito grande na Administração Pública que vai precisar passar por uma reconfiguração tanto no âmbito de uma teoria, do seu próprio regime jurídico, quanto uma reconfiguração interna, porque a administração passa de uma administração analógica para digital. A partir de então, ela também tem que se modificar, se reconfigurar internamente para conseguir fazer com que as promessas da administração digital se concretizem, que é a transparência, a eficiência e a participação”.
Palestrante: Miriam Wimmer.
Tema: Transformação Digital e Inteligência Artificial
“A inteligência artificial é uma promessa da tecnologia que traz impactos disruptivos em todas as áreas da economia, no governo e também nas nossas relações sociais. E o papel da Administração Pública, face a inteligência artificial me parece que é duplo. De um lado a gente tem a responsabilidade de incorporá-la de maneira segurança e responsável de modo a promover maior transparência, desburocratização, eficiência na aplicação de recursos públicos e prestação de serviços ao cidadão de maneira mais simples; de outro temos também a responsabilidade de criar um ambiente jurídico e regulatório, e um ambiente de políticas públicas em que a incorporação de inteligência artificial, pela nossa economia e sociedade, possa se dar também de maneira a promover o máximo de benefícios minimizando eventuais riscos que possam existir”.
Palestrante: Eneida Desiree Salgado
Tema: “Desprezo à Constituição e aos princípios da Administração em tempos de erosão democrática e populismo”
“Quando me disseram da Conferência e que a ideia seria tratar de uma nova visão da Administração Pública, eu pensei em falar dos riscos para a Administração Pública mesmo no Estado Democrático de Direito e aí, para tratar de democracia e informação eu pensei em falar nesse pensamento autoritário que pode levar a um retrocesso em relação à transparência, e a volta, bastante forte, dessa cultura do sigilo e do obscurantismo. Uma outra intenção foi trazer o que está sendo discutido no mundo em relação ao resultado de eleições democráticas que levaram discursos autoritários ao poder e por isso falar de populismo, erosão democrática e os princípios da Administração Pública”.
Palestrante: Karina Furtado Rodrigues
Tema: “Acesso à informação e a cultura do sigilo na Administração Pública”
“O sigilo é democrático quando ele é democraticamente pactuado. Então, por exemplo, a aprovação da Lei de Acesso à Informação foi um grande debate democrático de como responder aos cidadãos quando eles têm dúvidas das ações do governo. É um pacto que eu considero como lei muito forte – a questão é como isso se transfere como prática para as organizações públicas. Então o segredo tem que ser usado quando ele é necessário e de acordo com essas regras, caso não esteja de acordo com essas regras, é um segredo que não deveria existir”.
Palestrante: Denise Luci Castanheira
Tema: Mediação no novo Direito Processual Civil e Métodos Alternativos de Resoluções de Conflitos
“A utilização da mediação no âmbito administrativo reflete essa nova percepção moderna de Administração Pública sob o paradigma da eficiência, bem como o uso de métodos de justiça multiportas pela Defensoria Pública trazem ressignificação ao acesso à Justiça enquanto instrumento potencializador da cidadania para os grupos mais vulneráveis em nosso País”.
Palestrante: Raquel Melo Urbano de Carvalho
Tema: “Entre a LINDB, a crise do controle e a desestatização: o Direito Administrativo sobreviverá?”
“A gente vive no Brasil um momento que muitos qualificam como de crise e eu adorei poder colocar que crise é um momento não só de ruptura, mas também de renascimento. E a dúvida de que a Administração Pública sobreviverá coloca em questão a possibilidade do renascimento do Direito Administrativo como até hoje o se compreendia. E um dos aspectos que leva ao questionamento ‘vai ou não sobreviver”, é justamente a mudança decorrente da da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, que adotou novos parâmetros para toda interpretação que vincula a Administração Pública e quem a controla, inclusive o Poder Judiciário, as críticas que vêm sendo feitas a quem exerce a função de controle e ao movimento de retração de normas administrativas de prevalência do Direito Privado e de privatização que vem sendo adotado recentemente em diversos setores.
Vai sobrar norma de Direito Administrativo, o Direito Administrativo vai sobreviver e a intenção é que as pessoas ao se questionarem isso, vejam que a ação cotidiana delas pode levar sobrevivência após o renascimento de um novo Direito Administrativo e que para isso é preciso que cada um de nós possamos nos engajar, individualmente, que sem engajamento, seriedade, comprometimento, amor no exercício das nossas atribuições e principalmente da advocacia pública, não tem como seguir adiante. Vamos seguir, vamos seguir juntos, vamos seguir com esperança”.
Fonte
Texto: Ana Viégas
Fotos: Ana Viégas
Secom – Governo de Rondônia